quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Quem Te Traz as Cores - Capítulo 7.2

Alexandre Barbosa da Silva

Capítulo 7: Inglaterra (Parte 2)




Depois de jantarem em um restaurante não muito distante do hotel, resolveram ir a um pub, aproveitando o clima Rock and Roll da cidade. Era um local comprido, porém estreito, com um palco ao fundo e mesas de madeira envernizada, combinando com o aspecto rústico e aconchegante das paredes e do bar.

Sentaram-se em uma mesa distante do palco, para que a música ao vivo não chegasse a impedir uma conversa.

- E então, por que não respondeu a minha mensagem? – perguntou Douglas quando chegou com as bebidas que haviam pedido.

- Ah, por que meu celular quebrou – respondeu ela – deixei cair da sacada, agora estou com um novo.

- Então foi por isso... depois tem que me passar o número do novo.

- Aham, você também tem que me passar novamente, não tenho mais o seu.

- Ok, sem problemas – disse Douglas tomando um gole da bebida e fazendo uma careta – então, me conta, como foram as coisas com o seu pai?

- Estranhas no começo... – começou ela arrumando o cabelo – sabe como é, nós não tínhamos, e não temos ainda, muita intimidade. Mas começamos a nos conhecer um pouco melhor, passeamos juntos e tal, colocamos o papo quase em dia. Ele me contou que mandava cartas pra minha mãe. Que depois de uns anos havia se arrependido de ter perdido o contato comigo, e tentou voltar atrás, mas minha mãe não queria mais saber, embora mandasse notícias minhas para ele sempre. Eu a entendo sabe? Porque ela não deixou ele se reaproximar... quer dizer, como ela saberia que ele não faria isso de novo? Se ele tivesse feito teria sido ainda pior.

- Mas no geral foi tudo bem? – Douglas sentia que daqui a pouco estaria na fase da bebida onde começaria a falar demais – Você disse que passearam, chegou a conhecer algum lugar legal?

- Ah, não fomos a nenhum lugar turístico ou marcante assim. Nós saíamos pra jantar, e ele me levou pra patinar no gelo... ele disse que a minha mãe contava pra ele dos torneios que eu participava e que sempre quis ver.

- Sério? Você patina no gelo mesmo, como essas profissionais das olimpíadas de inverno?

Gabrielle riu.

- Não como elas – e riu novamente – mas eu treino bastante.

- Que legal, nossa. Nunca tinha conhecido ninguém que fizesse isso. E você gosta?

- Se eu gosto? – Douglas podia jurar que tinha visto os olhos dela brilharem – Pra mim, patinar é o mais próximo que o ser humano pode chegar de voar. É uma sensação incrível, sério – e então ela deu um último gole na sua bebida, pedindo outra logo após.

Continuaram conversando por mais algum tempo, até que o cansaço da viajem os abateu, e retornaram ao hotel para dormir. Como ela ganhara no par ou ímpar, ficara com a cama. “Você roubou!” ele disse. “Como poderia?” ela respondeu com um sorriso.




Ao todo passaram quatro dias na Inglaterra, conhecendo pontos turísticos como o Palácio de Bucknghan, o Parlamento, o Big Ben e lugares famosos devido aos Beatles terem tocado lá o passado. Em um desses passeios, Douglas avistara ao longe um lugar que pensou ser perfeito para ir com Gabrielle na noite que antecedia a partida deles para a França.

“Eu tenho um plano para esta noite. Eu vi um lugar que acho que você vai gostar.” Foi o que ele disse para ela.

“Onde?” ela perguntou curiosa.

Ele não respondeu.

- Agora você vai ter que colocar isto na frente dos olhos – disse ele ao chegarem a uma esquina, segurava um paninho preto para servir de venda.

Ela o olhou com uma expressão desconfiada.

- Tudo bem – ela disse meio que a contragosto, depois colocou o paninho ao redor da cabeça e Douglas deu um nó.

Ele a conduziu virando a esquina e por mais uns 100 metros até uma construção grande, parecida com um ginásio. Quando entraram sentiram a temperatura diminuir. O coração de Gabrielle acelerou. Quantas vezes já não havia tido essa sensação? Sabia exatamente onde estava, mesmo não sabendo ONDE exatamente estava. Adorou a surpresa antes mesmo de abrir os olhos. Gostava mais de Douglas agora do que antes. Na verdade não era o fato de gostar mais... era o GOSTAR que havia mudado...

- Pode abrir – ele disse soltando o nó que havia feito.

Ela abriu os olhos e viu aquilo que já sabia, a pista de patinação. Ouviu o som que tanto gostava... do atrito entre o gelo e a base metálica dos patins das pessoas que estavam lá. Olhou para Douglas e abriu um largo sorriso, ainda mais desconcertante do que o que ela havia lançado para Roberto para pedir-lhe um favor no avião para a Itália.

Ele retribuiu, a pegou pelo braço e se dirigiu até o local onde pegariam os patins.

- Você também vem né? – perguntou ela.

- Ah não, nunca fiz isso, vou passar vergonha na frente de todo mundo. Nem pensar.

- Ah, vamos. Tudo tem uma primeira vez. Vai deixar a oportunidade passar? – então ela lhe lançou um olhar que fez com que nos próximos minutos os dois estivessem devidamente calçados e prontos para patinar.

- Tá, eu vou, mas quero que você vá primeiro – falou Douglas com as pernas tremendo, segurando-se no muro de proteção – eu quero ver o que você sabe fazer.

Ela já o havia convencido a entrar, então aceitou esta condição. Além disso, estava ansiosa para um “vôo solo”.

Douglas sentou-se em um banquinho no canto da pista, enquanto Gabrielle deslizava para uma área menos ocupada. O que ocorreu a partir disto, teve dois pontos de vista (principalmente).

Douglas sentado no banco observou-a “flutuar” como se os patins fossem partes do seu corpo. Ela foi até um canto, colocou as mãos na parede e depois se lançou a pista. No começo com movimentos simples, a expressão séria. Aos poucos porém, ela começou a realizar movimentos com as mãos como se estivesse dançando balé, um pequeno giro no mesmo lugar... Um salto e uma pirueta, pá! O som de quando os patins dela bateram no chão congelado chamou a atenção dos outros. Douglas estava hipnotizado. As pessoas abriram espaço na pista apenas para vê-la percorrer toda a sua extensão em poucos segundos. Agora a sua expressão mudara. Douglas viu em seu rosto a pura alegria, e apesar disso, seus movimentos eram perfeitos, enérgicos e cada vez mais complicados. Até que por fim, ela começou em um rodopio no mesmo lugar e cada vez mais rápido. Quando ela parou ofegante em uma pose elegante, com o sorriso mais lindo e sincero que Douglas já vira, as poucas pessoas que não estavam perplexas demais, aplaudiram. E então Douglas percebeu duas coisas. Uma: Os olhos dela estavam brilhando com as lágrimas que não paravam de sair e descer pelo seu rosto. E dois: Era absolutamente impossível não admirá-la e a sua paixão. No caso de Douglas, era impossível que não começasse a se apaixonar por ela nesse instante.




Era sempre assim. Quando ela se lançava a pista, a primeira preocupação era executar os movimentos mais simples, sentir que todas as partes do corpo estavam obedecendo como se deve. Ajustar-se ao vôo, até que não precisasse mais do controle... Aos poucos, a adrenalina a deixava acelerada e todos os seus movimentos aconteciam automaticamente, como uma sinergia entre todos os sentidos, deixando-a livre para aproveitar o passeio. Nesse ponto, exatamente nesse momento, ela começava a voar... O ar gelado e delicioso passava ligeiro tocando o seu rosto. Não existia nada a sua volta que a parasse. Não via ninguém. A única coisa que via eram os borrões das cores que passavam rápidas pela sua retina, quase como que formando um quadro surrealista. As lágrimas sempre vinham também, eram impossíveis de controlar. Quando parava, e involuntariamente suas mão se erguiam e suas pernas repousavam em posições angulosas, todo o mundo voltava ao foco. Ela simplesmente desejava jogar-se no chão ali mesmo, mas nunca se jogava.





As pessoas voltaram a seus passeios, e ela ainda estava parada no meio da pista quando Douglas veio desengonçado, proferindo frases onde ela só entendia “...foi incrível...” e “...sério...”. Ela sempre fora um ser impulsivo, mas nunca havia feito o que ela tinha certeza que estava prestes a fazer.

Quando ele se aproximou ainda balbuciando algumas palavras ela o abraçou. Depois afastou-se um pouco dele e colocou as mãos atrás do seu pescoço. Pela expressão dele (que agora calara a boca), ele não entendia o que estava acontecendo ou não acreditava. Os olhos marejados de lágrimas de Gabrielle fixaram-se nos de Douglas, que finalmente entendeu o que se passava. Lentamente ela aproximou os lábios dos dele, que retribuiu fechando os olhos.

Ah, com certeza era impulsiva, ela pensou.

E como ele desejava aquilo.

O beijo em si durou poucos segundos, e então ele deu a ela o que ela desejava.

Com o beijo, Douglas perdeu a concentração na coisa que até aquele momento era a mais importante: Manter-se em pé. Um dos pés dele escorregou, o que acabou levando o outro pelo mesmo caminho. Como ela agora estava com os braços entrelaçados atrás do pescoço dele, caiu junto no chão gelado.

Por um instante Douglas sentiu dor no local onde batera a cabeça. Ela não, afinal, havia caído primeiro em cima dele.

Ficaram se olhando por uns segundos.

- Ai – ele disse.

E caíram na gargalhada, até começar a doer, deitados ali no chão frio com as pessoas passando na volta. Depois pararam um pouco para recuperar o fôlego, e riram mais. Igual a dois malucos.


Um comentário:

  1. eba!
    atualizei as leituras do teu livro por aqui! :)
    to adorando a história!
    beijo!!!

    ResponderExcluir