terça-feira, 10 de abril de 2012

Dualidade - Capítulo 1

Alexandre Barbosa da Silva

Capítulo 1: As coisas estranhas e como eu as ignorava


Antes de começar esta narração, onde contarei várias de minhas proezas, como ter derrotado a Fada dos Dentes e o Lobo da Capital, ou simplesmente ter nascido, deixe-me esclarecer algumas coisas.

O prólogo foi escrito em terceira pessoa, a partir de um relato meu. Eu e Alejandro decidimos isso antes de começarmos a escrever: Prólogos e epílogos seriam escritos por outra pessoa. Sim, há dois prólogos e o meu vem primeiro por que eu ganhei do Alejandro no par ou ímpar (ele sempre coloca dois). Só um de nós vai chegar ao fim da história vivo, mas ambos escrevemos nossas próprias versões dos acontecimentos, e escreveremos até que o coração de um de nós pare de bater. Neste caso, será o fim da história, e o cara que escreveu o[(s)] prólogo[(s)] dá um jeito de terminar e editar. Não, não são duas histórias, combinamos de intercalar os capítulos de cada um, assim como nossas vidas acabaram se misturando.

Ah, eu queria começar com uma frase de impacto (mesmo que não seja muito boa), e ela deveria estar na sinopse da aba da capa do livro ou coisa assim (provavelmente está). É essa: Seja bem-vindo ao circo dos horrores que algumas pessoas chamam de mundo.
P.S. Espero que se for eu a bater as botas, que Alejandro cumpra a palavra de deixar meu prólogo e meus capítulos na frente.



Você já notou como as pessoas ignoram as coisas estranhas que acontecem com elas? Dizem que é coincidência ou qualquer coisa. Acredite, você não deve ignorar quando as lâmpadas dos postes se apagam sempre que você passa. Vultos? Sim, há alguém, ou algo, alí naquele canto escuro. Ah, sempre atenda telefones públicos que tocam no meio da noite, no momento exato em que você passava... sozinho.

Claro, qualquer coisa dessas pode mesmo ser coincidência, mas também pode não ser, e eu aprendi do jeito difícil.

Ela digitou:

“amorzinho! Vms ao show do Samba Muleke hoje como vc prometeu, naum vamos? Vc disse que ia ceder um pouco tbm!”

Eu digitei:

“Ah!!! Eu tinha esquecido amoreco... mas foi por causa da febre...”

“febre amorzinho? AWNNNN, deixa a sua pitchuquinha ir até aí cuidar de vc! *-*”

“Não precisa não, a minha mãe tá cuidando de mim, e você sabe, vocês não andam se dando muito bem.”

“td bem, já que vc insiste... mas vc não vai se importar intaum se eu for ao Samba Muleke... vai? Vc confia em mim naum confia?”

Ok, é justo, pensei.

“Tá bom amor, pode ir ao seu pagodinho. Eu confio em você.”

Ela não era exatamente minha namorada. Quero dizer, eu meio que não suporto muito ela, mas sabe, um homem tem necessidades... e ela não era exatamente de se jogar fora. Fisicamente falando.

Bom, eu posso ser muitas coisas, mas não sou hipócrita. Claro que ela podia ir ao show dela. Afinal, naquela noite eu ia pra casa de um amigo encher a cara enquanto fazíamos campeonatos dos mais variados no novo videogame dele. Já jogou um game de corrida desses ultra-velozes com a cara cheia? É bem legal.

Mas para vocês entenderem direito o que se segue, vou voltar uns dias no passado, mais precisamente sete dias antes, quando fiz exatamente o que eu planejava fazer na noite que acabei de descrever.



Eu saía meio cambaleante da casa do meu amigo Ricardo. A parte boa da bebedeira já tinha passado, e tudo o que eu mais queria era chegar em casa o mais rápido possível.

Quando estava na rua da minha casa, vi um vulto atravessando a rua na distância. Na minha condição tive certeza de ter imaginado. Quando cheguei ao local onde pensei ter visto o vulto, havia uma cão enorme, no canto da rua, num terreno baldio e ele me olhava fixamente. Normalmente teria ficado maio paralisado. Me cago de medo de cachorros, confesso. Mas naquele momento eu simplesmente fiquei encarando-o também, por um tempo.

Ele se aproximou sem tirar os olhos de mim, como se me examinasse. Depois eu ouvi um barulho
atrás de mim. O cão olhou e deu um passo atrás, quando me virei para olhar, não havia nada que indicasse de onde viera o som. Voltei a me virar para o cachorro, mas ele não estava mais lá. Segui meu caminho, mas não lembro de como cheguei em casa.



Vê? É a este tipo de situação que eu estou me referindo. Não ignore essas coisas. Já dizia J.K. Rowling: “Os trouxas! E eles lá escutam direito? E também não enxergam direito. Nunca reparam em nada, não é mesmo?” (Não sei se posso usar frases de outro livro aqui, se não puder, que o editor mude essa parte).

Bom, na noite do show do Samba Muleke que eu habilmente evitei, eu e a gurizada repetimos a dose. E repetimos, repetimos, repetimos.

Quando saí da casa do meu amigo, via pouco mais de um palmo a frente dos olhos. Há umas duas quadras da casa dele, em uma rua totalmente deserta e mal iluminada, eu tropecei e praguejei. Olhei pra baixo pra ver no que tropeçara e sorri. Eram apenas meus cadarços soltos! Não havia sido por causa da bebida, não!

Abaixei-me para amarrá-los, o que consegui com alguma dificuldade e resolvi seguir meu caminho. Só que no momento em que eu me levantei dei de cara com o cão enorme do outro dia, e ele parecia ainda maior. Praguejei novamente devido ao susto, e aí sim, paralisei. Ele se aproximou de mim e eu tentei recuar. Caí de bunda no chão.

“Tem certeza de que é esse aí?”

Olhei para os lados procurando quem falara. Não havia ninguém. A idéia que passou pela minha cabeça me aterrorizou e divertiu ao mesmo tempo.

“Tenho” disse outra voz do além.

“Ok garoto, eu tenho que falar contigo, uma coisa importante.”

Novamente eu olhei para os lados desorientado. O cão colocou a pata enorme na minha cabeça e empurrou, no que eu juro, pareceu muito com um peteleco na orelha.

“Sou eu mesmo garoto, chega de palhaçada.”

Eu estava certo, era o cão que falava. Sem mover os lábios. Eu parei por um segundo para absorver aquilo. E caí na gargalhada.

- Você?! – eu disse – sério? HAHAHAHAHAHAHAHAHA!

Então senti algo se revirando dentro de mim. Algo estava voltando. Não sinto orgulho dos sons que produzi ao lavar a calçada de uma pequena padaria. Juro que o cão me olhou com uma expressão de extremo desgosto.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Dualidade - Prólogo 2

Alexandre Barbosa da Silva

Prólogo 2

O rapaz estava sentado sobre o túmulo frio, como sempre fazia. Brincava com o celular entediado, lendo e relendo a mensagem, e sempre achando que era uma grande palhaçada, um trote, uma brincadeira de mau gosto.

É claro que ninguém apareceria naquele cemitério aquele dia. Por que domingo? Se a pessoa sabia que ele ia lá toda a quinta-feira, por que não apenas aparecer e falar com ele neste dia?

É claro que ninguém apareceria naquele cemitério. Mas... como esta pessoa sabia aquelas coisas sobre ele? Bom, talvez apenas fosse o caso que muitas pessoas pensam parecido, e ele não era tão especial como achava. Não, não era isso.

Bom, tinha que esperar pra descobrir.

Não precisou esperar muito. Uma meia hora depois do horário marcado, ele viu um clarão a direita, atrás de umas tumbas cobertas de hera. Encolheu-se sobre o túmulo gelado, puxando as pernas para cima. Um som de passos e de folhagem se mexendo começou a aumentar de volume. Alguém vinha caminhando por entre as criptas.

Quando viu quem era, ou melhor, o que era, sentiu suas entranhas se revirarem, mas não gritou, apenas esperou. Um lobo enorme caminhava na sua direção. Tinha uma aparência perversa, mas quando falou, se é que falou, pois não abriu a boca, sua voz era suave, e parecia atrapalhado.

“Olá garoto! Desculpe o atraso... é um mau hábito.”