terça-feira, 8 de novembro de 2011

Histórias de uma História



Conto 4

Quando era criança Douglas tinha muitas perguntas em sua cabeça, era daquelas crianças tímidas que quase não falam na presença de estranhos. Porém quando estava com sua mãe Douglas perguntava sobre tudo, perguntas do tipo “Por que os pássaros podem voar e nós não?” e sua mãe Cristina lhe respondia que para tudo na vida existe um propósito, um sentido, um ciclo, ela falava que tudo na natureza é perfeito e completo, tudo na vida intocada pelo ser humano tem um sentido...

Douglas era uma criança feliz naquela época, queria ser astronauta para poder ver as estrelas mais de perto. Gostava das noites de verão onde deitava no gramado do quintal e colocava sua mão na direção do céu e fingia pegar as estrelas com suas próprias mãos e dar de presente para sua mãe ou seu pai.

Em uma certa noite de verão um besouro caiu de costas no piso da varanda atordoado por uma lampada fluorescente, ele esperneava, mas não conseguia se virar, pois suas costas eram arredondadas. Douglas ficou algum tempo observando o inseto na expectativa de que ele conseguisse vencer aquela dificuldade. Sem resultado ele desistiu e ajudou o pequenino inseto voador da noite. Na mesma semana ao ir ao zoológico viu uma tartaruga virada da mesma forma, que não conseguia voltar à posição normal. Intrigado perguntou a sua mãe Cristina logo que chegou em casa o por que de alguns insetos e tartarugas não conseguirem tocar os pés no chão novamente quando caem. Cristina olhou no fundo dos olhos do garoto e disse “Eu não sei filho, mas tudo tem um propósito”

Os anos passaram e Douglas era um jovem de 23 anos de idade cursando faculdade de astronomia. Sua mãe havia falecido fazia 5 anos. Douglas sofrera muito na época, mas com o tempo superou e aceitou o acontecido. Levava aquela pessoa divertida e carinhosa que era sua mãe em suas lembranças todos os dias. Ele vivia com seu pai e tinha uma vida feliz e simples, estudava o que gostava e isso já bastava.
Douglas sempre gostou da maneira como sua mãe enxergava a vida, isso com certeza o ajudou a sempre ver a vida com alegria apesar das dificuldades, era disso que ele sentia falta agora. Curiosamente para todas as perguntas que ele fazia ela sempre tinha uma resposta com exceção daquela pergunta “por que os insetos e tartarugas quando caem não conseguem se virar?”

Em uma quinta feira de inverno Douglas saiu mais cedo de casa para ir até a faculdade ajustar alguns telescópios. Na rua o céu estava nublado e o trânsito mesmo de manha já era bem movimentado. Várias pessoas atravessavam as ruas, outras entravam e saiam de lojas, a vida era uma coisa quase que automática na visão de Douglas, por isso ele se interessava tanto pelo espaço sideral que era algo mágico e desconhecido. Ele chegou até uma grande avenida onde esperou o sinal fechar para atravessar, quando o sinal ficou vermelho para os carros ele deu o passo que mudaria sua vida completamente.

Um ônibus vinha ao longe, mas de imediato pareceu não ver o sinal fechado, quando se aproximou perigosamente da faixa de pedestres o motorista enfiou o pé no freio fazendo um grande escândalo com o barulho da borracha dos pneus fritando no asfalto. Douglas tomou um susto quando viu o ônibus vindo em sua direção freando, ele tentou correr, mas já era tarde. O ônibus o atropelou, mesmo depois de frear, lógico que com muito menos força do que se estivesse em plena velocidade.

Ele viu o mundo girar em várias direções, o som havia sumido, a cor havia sumido. Quando o looping parou ele se viu com o rosto encostado no asfalto e vários pés correndo em sua direção, a ultima coisa de que viu antes de apagar foi uma mulher linda de cabelos ruivos saindo do ônibus o observando com uma expressão de pena por alguns breves segundos até que tudo sumiu como se uma vela fosse apagada no meio da noite.

Douglas acordou algum tempo depois em uma cama de hospital, onde lhe contaram sobre tudo o que havia acontecido, soube que como a ambulância demorou o levaram no ônibus até o hospital. Apesar de tudo que havia acontecido ele se sentia bem, não sentia dor nem nada do tipo. Seu pai estava ali do seu lado lhe apoiando junto de alguns parentes. Porém algo estava diferente, ele não sabia dizer o que exatamente.

Foi quando ele recebeu a noticia do médico que nunca mais poderia andar devido ao acidente que havia provocado uma fratura permanente na coluna, aquilo o acertou como um tiro fulminante no peito. Ele não esperava por aquele tipo de noticia, seu coração disparou seguido por pânico e medo. Seu pai o abraçou tentado reconfortá-lo quando lágrimas rolaram pelo seu rosto. O que ele tinha de fazer agora era aceitar e levar a vida normalmente. Curiosamente um livro de capa azul com algumas nuvens desenhadas repousava no criado mudo ao lado de sua cama, o médico disse que pensaram que o livro era de Douglas, pois estava dentro do ônibus que o trouxe até o hospital.

O tempo passou e Douglas agora era um cadeirante e querendo ou não sua vida havia mudado. Ele continuava na Faculdade apesar de todas as dificuldades, porém não aceitava o que havia acontecido, se sentia incompleto, sentia-se incapaz, antes era uma pessoa independente e agora dependia de ajuda para fazer várias coisas, um vazio lentamente tomou conta de seu coração seguido da falta da vontade de viver o que o levou a tentar o suicídio, porém fracassou, pois foi impedido por um colega de faculdade quando tentava se jogar da janela do quinto andar do prédio.

Desde então duas vezes por semana fazia seções com um psicólogo em um hospital. Certo dia na sala de espera do psicólogo do hospital abriu o livro de capa azul com desenhos de nuvens que estava em sua mochila e se deparou com palavras que o tocaram profundamente, palavras que faziam muito sentido. Mas aquilo não era suficiente para Douglas. Parado ali naquela cadeira ele se sentia como um daqueles besouros que caiam de costas e não conseguiam se virar novamente para tocar os pés no chão. Nem os besouros nem ele tinham um propósito no mundo pensou consigo com uma profunda mágoa no peito, sentia falta da sua mãe mais do que tudo.

Ao ler mais um pouco do livro notou que haviam anotações feitas à caneta em algumas páginas. Ele pegou uma caneta em sua mochila e escreveu algo no livro e o deixou na sala. Estava decidido, iria se matar dessa vez, pois não encontrava uma resposta para si mesmo no mundo, achava que Deus não existia como Deus poderia ter feito aquilo com ele? Como Deus havia feito insetos e animais incapazes de se levantar de modo tão irônico, sendo que a natureza era para ser perfeita?

Ele foi até a sala 208 onde a janela era ampla, se ajeitou fitando o chão, a queda com certeza o mataria, era questão de impulsionar o corpo para frente e se agarrar com os braços para despencar. Antes de fazer tal atrocidade ficou ali pensando na sua vida, não conseguia ver sentido em tudo, não acreditava mais em seu futuro, não achava a resposta que mais queria “por que os insetos e tartarugas quando caem não conseguem se levantar?” “por que eu não consigo me levantar? Por que a vida tem de ser assim qual o propósito?”

Ele se apoiou na janela e começou a se puxar com os braços em meio a lágrimas, pronto agora era só se jogar e em alguns segundos a agonia iria sumir a dor iria sumir tudo iria sumir. Foi quando um homem com uma cicatriz no rosto entrou no quarto sem fôlego e foi na direção de Douglas o tirando da janela. Era Daniel que disse em meio a respirações rápidas “eu sei a resposta do por que os insetos e tartarugas quando caem não conseguem se Levantar! Você pode se levantar eu tenho certeza que pode!”

Daniel mostrou o livro da capa azul para Douglas em uma determinada página onde havia algo escrito a mão. Douglas olhou aquela página e teve certeza, era a letra da sua mãe, a resposta estava ali...

O que mais estava escrito no livro?

Qual a resposta para o sentido da vida de Douglas?

Por que a vida é como é?

Continua...

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