Alexandre Barbosa da Silva
Eu vejo seus rostos. Sentados ao redor de uma enorme mesa redonda e dourada. Não existem janelas, nem vidros nem mesmo paredes ao redor da mesa de banquete. Apenas alguns suntuosos pilares também dourados, que sustentam um teto desenhado e ornamentado. Pendurado nele estão os sete planetas do nosso sistema. Cada qual emanando uma luz própria.
A luz do sol ao entardecer, refletida no espetacular piso encerado é ofuscante.
Mas essa luz logo vai embora, sendo substituída pela fraca luz do luar. Mais fraca, mas não menos bela.
É nessa hora que ele vem até mim. Quando os outros estão todos distraídos. Ele me fala coisas belas. Do tipo que eu não teria criatividade para falar as garotas enquanto acordado. Mas por que ele fala essas coisas pra mim? Sonhar com outro homem – que diga-se de passagem se parece com um George Clooney mais musculoso- lhe dizendo o quanto o ama e depois o levando até um quarto não é exatamente muito másculo. Ainda mais várias vezes. Agradeço por sempre acordar após ele fechar a porta do tal quarto...
Sempre pensei muito sobre isso. Nunca gostei de nenhuma garota antes... nem de nenhum garoto também! Até algumas semanas atrás, quando a conheci. Ontem mesmo, quando contei a ela sobre esses sonhos que tenho tão freqüentemente, ela me sacaneou. “Isso não é tipo, muito gay?” Depois riu. Ah, se ela soubesse... pelo menos conscientemente...
A conheço há tão pouco tempo, mas ao mesmo tempo me importo tanto com ela... Tenho certeza de que a freqüência desses sonhos aumentaram depois que a conheci. Tenho certeza que ela tem alguma coisa a ver com a minha insônia em um dia, e o sono extra-longo no outro. Com a minha constante inquietação com o mundo e a vontade de cometer vandalismos pela cidade. Quebrar um pouco esse mundo de tanto progresso. Em alguns dias, eu me reviro na cama e não durmo, em outros eu não quero acordar, por que acordando eu vou ter que pensar. E pensar simplesmente dói.
Neste, que é o primeiro dia do resto da minha vida, embora eu ainda não saiba disso, é claro (sim, é contraditório), eu apenas estou com vontade de correr até o local mais deserto perto da praia que eu conseguir, e gritar. Xingar os deuses e chorar. Talvez deitado na grama, enquanto observo as nuvens no céu por entre a cortina de lágrimas que distorcem tudo. E é exatamente isso que eu faço. Enquanto choro, eu me pergunto por que estou fazendo isso. Porque me sinto assim? Quero dizer, EU não sou assim!
Sempre me senti como se uma pessoa me observasse das sombras. A vida toda. Portanto não percebi que hoje realmente havia alguém me observando. Um homem negro, vestindo um suéter me observa sentado na areia, a alguns metros de mim. Ele espera até que eu o perceba. Então se levanta, vem até mim e diz:
- O fim do mundo está chegando. Não me admira que você esteja assim. Você pode
saber da verdade agora se quiser, mas receio que não vá mudar muita coisa... não acho que eles estão dispostos a perdoar...
Já anoiteceu quando estou correndo em direção a casa dela. As pessoas me olham como se eu fosse um louco... elas é que não olharam para o céu ainda. Que mania das pessoas de nunca olharem para cima!
Eu aperto o botão do interfone como louco. Ela atende furiosa.
- O que é hein? Quem é? Acho bom que seja impor...
Ela calou a boca. Com certeza da pra ver o céu da janela da cozinha dela.
- Desce! – eu digo.
A porta do elevador se abre com um ”plim” sonoro, e ela vem correndo até mim. As nuvens que eu observava mais cedo estão formando um redemoinho agora. O vento começa a soprar forte, e a fazer barulho. Raios cortam o céu noturno.
- O que está acontecendo? – ela pergunta desesperada.
- Eu descobri tudo!
- Tudo o que?
- São os nossos mundos! Somos nós! Nossos mundos estão conectados! Eu e você também... você não devia estar aqui! Entende? É tudo por causa disso!
Ela tentava entender. Dava pra eu ver na expressão dela que de alguma forma, o que eu dizia fazia algum sentido.
- Estamos amarrados a esta escuridão! – apontei pra cima.
Os raios começaram a ficar mais intensos, até que uma esfera gigantesca se abriu no céu. Como um grande portal. E dele saíram correntes colossais com ganchos nas pontas que se prendiam ao chão. Alguns deles simplesmente esmagavam prédios inteiros.
Enquanto a terra tremia, e um som retumbante, quase mecânico tornava impossível de ouvir qualquer outra coisa, eu pude ver as palavras se formarem nos lábios dela:
“Eu entendo”
Então eu fiz algo impensável para a situação em que me encontrava: Sorri e fiquei com cara de bobo a encarando.
“Entendeu?”
Ela confirmou com um rápido aceno de cabeça e um sorriso.
Depois disso o som chegou a um nível insuportável. Nós dois caímos de costas na calçada e ficamos encarando o céu sem podermos nos mexer. Quando o som parou, Todas as luzes do mundo se apagaram.
Escuridão.
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