terça-feira, 12 de julho de 2011

Quem Te Traz as Cores - Capítulo 5

Alexandre Barbosa da Silva

Capítulo 5: Só é clichê até acontecer com você.

Para o pai, tudo parecia normal, mas para Douglas, mesmo a conhecendo há tão pouco tempo, era visível que Gabrielle não estava ali. Mas ele tinha o pressentimento de que ela estava chegando, pouco a pouco, por entre os sorrisos forçados e a conversa cordial. Era como se ele estivesse olhando para uma bomba-relógio, como se ela não estivesse nem ouvindo a conversa com a qual concordava.

Douglas se preparou para a sua chegada quando ela deixou claro que não estava interessada em uma “história engraçada”, afastou a cadeira, olhou para os próprios pés e respirou fundo...





- Eu não tenho nada pra fazer mesmo, não se preocupe.

- Sério?

- É. Afinal foi pra isso que nós viemos juntos, pra darmos apoio um ao outro – disse Douglas terminando de se arrumar para um almoço com o pai de Gabrielle.

- Mas assim você vai perder tempo que poderia estar usando para conhecer a cidade.

- Na verdade não, todo mundo tem que parar pra comer.

Gabrielle estava apertando nervosamente os nós dos dedos.

- Tá… eu sei que fui eu quem pediu, mas tinha que me certificar de que você não estava deixando de fazer nada por minha causa.

- Não tem problema, eu só vou cobrar o favor em Paris.

- Combinado – ela disse indo em direção a porta com seu vestido preto de aparência cara, enquanto Douglas arrumava a gravata em frente ao espelho. Tinham que estar bem vestidos, o almoço era num restaurante muito fino, ou seja, caríssimo, freqüentado apenas por gente rica como o pai de Gabrielle e jovens namorados que gastam boa parte do salário para pedir a namorada em casamento – Vou te esperar no corredor.

E saiu rápido, fechando a porta atrás de si.

Douglas terminou com a gravata, deu uma arrumada no cabelo e então os dois saíram parra pegar o taxi que os levaria ao restaurante.




Para Douglas, o restaurante parecia um palácio, ornamentado com gigantescos lustres que refletiam no chão, que só pode ser descrito como “espetacularmente encerado”. Gabrielle não prestava atenção a esses detalhes e caminhava rapidamente atrás do funcionário que lhe mostraria a mesa reservada.

Seu pai não havia chegado ainda, então ela e Douglas sentaram-se para esperar. Gabrielle disse que pediria depois, pois estava esperando por outra pessoa .

- Chegamos cedo – disse gabrielle.

Douglas ainda estava admirando o local.

- Que bom que é você quem vai pagar a conta… - disse olhando perdidamente para um vaso de flores que só podia ser descrito como “absurdamente florido”. Gabrielle riu, ainda que nervosamente. Nesse momento, duas coisas aconteceram (principalmente, quer dizer, tirando o homem que Douglas viu de relance pelas enormes janelas de vidro que nem poderiam ser descritas, descendo de pára-quedas em plena rua): Douglas notou que as mãos de Gabrielle tremiam, e o pai dela chegou.

Um garçom lhe indicou a mesa e ele se aproximou de Gabrielle que se levantou. Douglas a imitou, como se estivessem na presença de um rei.

- Gabrielle? – começou mal com essa interrogação...

- Sou eu, sim – respondeu ela cordial, e estendeu a mão, que ele apertou com uma expressão estranha, como se esperasse um abraço.

- E o seu amigo, como se chama?

- Douglas. Ah, Douglas esse é o Diogo.

- É um prazer conhecê-lo – disse Diogo apertando a mão de Douglas.

- Igualmente – respondeu Douglas. O homem era alto, aparentando uns cinqüenta anos e muito bem vestido. Tinha uma presença imponente.

- Ok, vamos pedir então? – ele disse sentando-se, no que foi acompanhado pelos outros.

Depois disso seguiu-se um silêncio que só foi quebrado uns minutos depois de fazerem o pedido, quando Diogo começou a puxar assuntos e fazer perguntas sobre a vida da filha.

- E como foram os seus anos na faculdade?

- Bons – ela disse. Todas as respostas de Gabrielle eram assim, monossilábicas quando possível, e acompanhadas de um sorriso educado. Vendo que esta abordagem não era exatamente propícia para o momento, Diogo começou a falar da vida dele: “Certa vez eu fui à Nova Zelândia, já esteve lá?” “Não” “É mesmo? Talvez possamos ir lá um dia, é lindo...”

Falar da própria vida também não estava quebrando o bloqueio de Gabrielle, e a imponência de Diogo começava a diminuir perante a incapacidade dele de extrair qualquer coisa da filha. Douglas que não falava nada, só quebrou o jejum de palavras para dizer:

- Com licença, vou ao banheiro.

Nesse momento a expressão de Gabrielle mudou por um segundo, e ela olhou para Douglas quase suplicando.

- Eu já volto – ele disse a olhando nos olhos.

Alguns minutos depois , quando ele voltou do banheiro, parecia que as chances de sucesso de Diogo não estavam aumentando, e para Douglas, Gabrielle estava distante. Quando os pedidos chegaram, interrompendo a frase de Diogo que começou com “Ah, lembrei de uma história engraçada...”, Douglas percebeu que o teatrinho de Gabrielle ia cair por terra. Enquanto os garçons colocavam os pratos sobre a mesa, ela virou a cabeça para a janela, ficou olhando perdidamente para a rua com a mão no queixo cobrindo a boca. Soltou um suspiro que estava trancado desde que ela havia chegado ao restaurante. Talvez, desde sempre.

Quando os garçons saíram, ela afastou a cadeira da mesa e olhou para baixo, para os próprios pés, deixando que o cabelo caísse na frente do rosto. Respirou fundo e depois emitiu um som agudo, como um gemido de dor. Ela estava segurando-se para não chorar a todo custo. Diogo apenas a olhava impotente. Não tinha nenhuma experiência com filhos.

- Gabrielle – falou Douglas. Ela levantou os olhos cheios de lágrimas e os fixou nos de Douglas. Ele finalmente conseguiu ver de que cor eram os olhos dela, era um tom entre o verde e o amarelo mel, lindo... – você precisa fazer isso – completou.

Primeiro, a expressão dela foi de total surpresa e em seguida mudou pra tristeza e choro. Choro que começou baixinho e foi aumentando até poder ser ouvido pelas pessoas nas mesas vizinhas. Para ela, era como se estivesse à beira de um penhasco no qual estava pendurada, segurando-se para não cair. Aí então, sem aviso, ela simplesmente se jogou.

- Não! – ela gritou olhando para o pai - Eu não vou chorar! Não vou te acusar de ter nos abandonado, me abandonado! De não ter tentado fazer contato nos últimos... sei lá, quinze anos? Não vou dizer que é um idiota se está pensando que depois de todo esse tempo, um almoço e uma conversinha vão resolver tudo! E é claro! Não vou dizer que você fez falta nos meus aniversários e toda essa bobagem!

Diogo fez menção de falar, mas Douglas o lançou um olhar de negação.

- Por que não fez! Não vou cair nos clichês de reencontrar o papai que me abandonou! – Agora Gabrielle soluçava, dizia as palavras com dificuldade, parecia que não estava conseguindo respirar – Não vou chorar! Não vou! Eu não... – As palavras ficavam mais fracas, e as lágrimas escorriam pelo seu rosto. A cabeça estava baixa novamente.

Então ela ficou de pé.

- Desculpe... – não dava pra saber pra quem ela falara, pois ela olhava de um para o outro. Douglas apostava que era para si própria. Gabrielle se virou e começou a ir em direção a entrada do restaurante ainda chorando muito. Novamente, Diogo fez menção de se manifestar, mas Douglas fez um sinal para que permanecesse sentado e foi atrás dela.

A alcançou no saguão de entrada chorando baixinho, parada em pé, as mãos como se estivesse abraçando a si mesma. Douglas ficou de frente para ela, afastou os cabelos que lhe caíam nos olhos e a abraçou.

Ficaram ali parados por um tempo que não saberiam precisar. Toda a dor que ela sentia também estava nele, e o momento de confrontar isso estava próximo para ele também. Ele podia sentir ela tremendo em seus braços, e pensar no sentimento que compartilhavam o fazia querer abraçá-la ainda mais forte.

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